A Geração Distribuída desafia o modelo antigo de regulação energética no Brasil.

A Geração Distribuída desafia o modelo antigo de regulação energética no Brasil.
A Geração Distribuída desafia o modelo antigo de regulação energética no Brasil. - Foto: Reprodução / Freepik
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A revolução da Geração Distribuída no Brasil exige a criação de regras próprias, confrontando a inércia do modelo antigo focado na geração centralizada.

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A Geometria Implícita da Regulação Antiga

O modelo antigo brasileiro, historicamente baseado em grandes hidrelétricas distantes dos centros de consumo, foi construído sobre uma arquitetura de fluxo unidirecional. A energia era gerada em um ponto A, transmitida por longas linhas de alta tensão, e distribuída até chegar ao ponto B, o consumidor. As regras tarifárias, operacionais e de expansão foram desenhadas para otimizar essa cadeia de comando.

Nesse sistema, a geração centralizada era o pilar. As distribuidoras eram meras transportadoras de última milha. A lógica era simples: quem consome paga pela energia e por toda a infraestrutura de transmissão e distribuição necessária para levá-la. A Geração Distribuída subverte essa lógica ao injetar energia no meio da rede, mudando os parâmetros de fluxo e, crucialmente, desafiando a estrutura de custos estabelecida.

O grande problema é que a infraestrutura da Geração Distribuída não é apenas um custo. Ela é, na verdade, um ativo para o sistema. Ela alivia a sobrecarga nas subestações locais, reduz perdas técnicas e adia a necessidade de investimentos caríssimos em expansão de linhas de distribuição e transmissão em áreas congestionadas.

O Marco Legal da Geração Distribuída (Lei 14.300/2022) foi um passo gigantesco, mas revelou o conflito de mentalidades. Ele tentou criar uma ponte entre o novo e o modelo antigo, mas com concessões que geraram o debate que domina o setor: a “taxação do sol”. Essa taxação é, em essência, a aplicação de regras da geração centralizada a um ativo descentralizado.

A inclusão da cobrança escalonada pela TUSD Fio-B para novos entrantes é o sintoma mais claro dessa resistência. A TUSD (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição) é paga por todos os consumidores. O Fio B representa a parcela dessa tarifa que remunera a distribuidora pelo uso de seus ativos (transformadores, postes, cabos) para entregar a energia.

O ponto de fricção reside na compensação. No antigo sistema de compensação, o excedente de GD injetado era trocado 1 para 1, sem a cobrança do Fio B. A distribuidora argumentava que a GD usava a rede como “bateria” sem pagar por essa infraestrutura.

Por que a Cobrança do Fio B é a Regra Antiga em Roupa Nova

Insistir na cobrança integral do Fio B para a energia injetada ignora o valor de rede da Geração Distribuída. Um gerador local não está usando a rede de transmissão de longa distância; ele está apenas aliviando a carga de seu vizinho mais próximo ou da própria distribuidora local.

Ao tratar a GD como uma usina central que apenas usa a rede para escoar, desvalorizamos o benefício sistêmico. A GD injeta energia exatamente onde ela é consumida, evitando o desperdício inerente ao transporte em longas distâncias. Esse benefício, chamado de “Valor da Geração Distribuída” (VGD), precisa ser quantificado e incorporado nas regras próprias.

É um erro conceitual grave. A Geração Distribuída não apenas “usa” o sistema, ela o serve. Aplicar a mesma régua tarifária da geração centralizada é uma tentativa de preservar o balanço econômico das concessionárias dentro da arquitetura tradicional, transferindo a ineficiência do modelo antigo para o novo gerador.

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O Novo Código da GD Regras Próprias e o Futuro da Flexibilidade

Para que a Geração Distribuída floresça plenamente, precisamos de um código regulatório que reconheça sua natureza descentralizada e flexível. O foco não pode ser apenas “quem paga o quê”, mas sim “como otimizar o sistema para o bem de todos”.

As regras próprias da GD devem ser baseadas em três pilares:

1. Tarifas Dinâmicas e Locacionais: A remuneração da energia injetada deve variar de acordo com o local e o horário. Injetar energia em um horário de pico (como no final da tarde, quando a demanda é alta e o sol se põe) e em uma subestação congestionada tem valor muito maior do que injetar ao meio-dia em uma rede vazia. O modelo antigo de preço fixo não reflete essa realidade.
2. Valorização dos Ativos de Flexibilidade: As regras devem incentivar sistemas híbridos, como a GD combinada com baterias. A capacidade de armazenar e liberar energia sob comando (o dispatchable ) é o que garantirá a estabilidade da rede no futuro, mas o modelo antigo não remunera adequadamente essa flexibilidade.
3. Incentivo à Inovação Tecnológica: A GD está intrinsecamente ligada às smart grids. As regras próprias devem exigir e remunerar a capacidade de comunicação bidirecional e o controle automatizado. A inteligência da rede deve ser adaptada para gerenciar milhões de pontos de injeção, algo que a regulamentação centrada na geração centralizada jamais previu.

O problema de insistir no modelo antigo é que ele trava investimentos e inovações que o Brasil necessita urgentemente para descarbonizar sua matriz.

A Inércia Institucional e a Mudança de Mindset

Por que o setor insiste nessa camisa de força regulatória? É uma combinação de fatores: medo, complexidade e proteção de mercado.

A complexidade técnica de remodelar sistemas tarifários e operacionais é imensa. É mais fácil aplicar um remendo (a cobrança do Fio B) do que reformular toda a fundação.

Além disso, há o medo de ativos obsoletos (stranded assets). As grandes distribuidoras e geradoras que investiram pesadamente no modelo antigo temem que a descentralização diminua o valor e o retorno de seus ativos de transmissão e geração centralizada. A regulamentação, nesse contexto, vira uma ferramenta para amortecer essa transição, muitas vezes às custas do prosumidor.

A transição para um novo paradigma, onde a Geração Distribuída é um pilar da segurança energética, exige coragem regulatória. Não podemos forçar o século XXI a caber nas planilhas e modelos operacionais do século XX. O futuro da energia limpa demanda um novo código, com regras próprias que valorizem a eficiência, a resiliência e a descentralização, enterrando, de vez, a lógica ultrapassada do fluxo unidirecional. O custo de insistir no modelo antigo é o preço que a sustentabilidade brasileira paga pela inércia.

Visão Geral

A revolução da Geração Distribuída no Brasil não é apenas uma mudança tecnológica; é uma transformação estrutural e filosófica do setor elétrico. De repente, o consumidor virou prosumidor e as usinas gigantes e remotas cederam espaço para milhões de pequenos geradores acoplados à rede de baixa e média tensão. Essa descentralização é a chave do futuro energético. No entanto, o setor elétrico, com suas raízes históricas profundas, insiste em administrar essa nova realidade com o playbook do século XX. O tema central é: a Geração Distribuída precisa de suas próprias regras. Por que, então, reguladores e players tradicionais resistem a abandonar o modelo antigo e a lógica da geração centralizada? A resposta está na inércia regulatória e, principalmente, na proteção de um sistema que foi, por décadas, sinônimo de monopólio e controle de fluxo único.

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