Agência Internacional de Energia aponta motivos para manter o otimismo e quatro áreas que exigem atenção urgente para limitar as mudanças climáticas
Zerar as emissões de gases do efeito estufa até 2050 e limitar o aquecimento global em 1.5°C tornou-se mais difícil desde 2021, mas ainda é uma meta possível, indica estudo publicado pela Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês). O relatório listou quatro razões para acreditar que essa missão segue possível e quatro área que exigem ações urgentes.
Quatro razões para acreditar que será possível limitar o aquecimento global:
1. Políticas de incentivo à energia limpa estão avançando
Muitos países e um número cada vez maior de empresas estão firmando compromissos de zerar emissões. Até setembro de 2023, esses planos cobrem mais de 85% das emissões globais relacionadas ao setor de energia e quase 90% do PIB mundial. Noventa e três países e a União Europeia firmaram metas de descarbonização.
Além disso, governos de todo o mundo, especialmente entre as economias mais avançadas, responderam a pandemia e a crise de energia com ações favorecendo a geração renovável, carros elétricos, eficiência energética e outras tecnologias de energia limpa.
Objetivos de eletrificação da frota de veículos têm motivado grandes transformações nas estratégias industriais de fabricantes automotivos, em conjunto com a economia de combustível e padrões de emissões de CO2 na União Europeia, China e, mais recentemente, nos Estados Unidos.
Motos, triciclos e ônibus elétricos também registraram um forte crescimento na Índia e outros mercados emergentes e economias em desenvolvimento graças a políticas e incentivo, aumento da competitividade econômica e baixa necessidade de infraestrutura.
Os EUA, por meio do Inflaction Reduction Act, pacote do governo federal aprovado em 2022, forneceram financiamento sem precedentes para apoiar o desenvolvimento e reduzir custos de diversas tecnologias de baixa emissão, como a captura de carbono e o hidrogênio.
Sucessivos planos de cinco anos da China têm progressivamente elevado as ambições para a energia solar e derrubado os custos de equipamentos fotovoltaicos. A geração offshore de energia eólica na Europa se tornou uma indústria global.
2. A geração de energia renovável está avançando rapidamente
Investimentos e a instalação de energia renovável tem crescimento rapidamente em resposta aos sinais de mercado e incentivos financeiros viabilizados por governos, com a produção em massa de tecnologias como painéis solares, turbinas eólicas e carros elétricos liderando o caminho.
As vendas de aquecedores elétricos residenciais e sistemas de armazenamento de energia também estão avançando notavelmente. Desde a assinatura do Acordo do Paris, em 2015, quase 1 TW de energia solar foi adicionado no mundo, quase o equivalente a toda a capacidade instalada de energia elétrica na União Europeia. Cerca de 40% desse acréscimo ocorreu em 2021 e 2022 e mais da metade dos carros elétricos que estão em circulação no mundo foram vendidos a partir de 2021.
Como resultado, o aumento de capacidade de energia solar está à frente do cenário de emissões neutras até 2050 projetado pela IEA. A agência estima que a capacidade global de fabricação de equipamentos fotovoltaicos e baterias de veículos elétricos é suficiente para atender a demanda prevista em 2030, se todos os planos anunciados forem concretizados.
Esse progresso tem refletido na grande redução de custos vista nos últimos anos, com tecnologias de energia limpa apresentando queda de cerca de 80% entre 2010 e 2022.
3. As ferramentas para reduzir as emissões mais rapidamente já existem
As principais ações necessárias para derrubar a curva de emissões até 2030 são maduras e testadas e, na maioria dos casos, economicamente efetivas. Mais de 80% da redução adicional de emissões necessária até o final da década virá de fontes conhecidas: aumento da capacidade instalada de renováveis, maior eficiência energética, avanço na eletrificação e corte nas emissões de metano.
Os movimentos atuais são encorajadores, com a manutenção do ritmo de crescimento das renováveis visto na última década sendo o suficiente para atingir a meta e as atuais políticas em vigor colocando economias avançadas e a China no caminho para contribuir em 85% para esse objetivo mundial.
As vendas de veículos elétricos também estão avançando rápido o bastante para atingir as metas previstas até 2030 e o planos de produção anunciados pelos fabricantes automotivos sugerem que esse objetivo está dentro do alcance.
4. O mundo está encontrando respostas inovadoras
Existe uma redução notável na dependência de tecnologias em estágio inicial de desenvolvimento para viabilizar a neutralidade de emissões em relação ao estudo anterior da IEA, publicado em 2021.
Naquela época, soluções ainda não disponíveis no mercado respondiam por quase 50% das reduções necessárias até 2050. Agora esse número é por volta de 35%. O avanço tem sido impulsionado por ações da iniciativa pública e privada para acelerar o desenvolvimento e comercialização de tecnologias de energia limpa, com políticas de incentivo e o crescimento do mercado de geração renovável.
Investimentos em pesquisa e desenvolvimento na área de energia de empresas listadas em bolsa superaram US$ 130 bilhões em 2022, um incremento de 25% em relação a 2020, e os fluxos de capital direcionados para a energia limpa seguem fortes, apesar de um ambiente macroeconômico mais difícil.
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Quatro áreas que exigem atenção urgente:
1. Aumentar o investimento em energia renovável em mercados emergente e economias em desenvolvimento
O investimento em energia limpa precisa crescer no mundo todo, mas o avanço mais importante é necessário em mercados emergentes e economias em desenvolvimento. De 2015 a 2022, economias avançadas e a China responderam em conjunto por 95% das vendas de carros e aquecedores elétricos e quase 85% da capacidade adicionada combinada de energia solar e eólica.
Existem sinais positivos, como o progresso da energia solar na Índia, mas o investimento médio em energia renovável permanece estagnado desde 2015 fora das principais economias. Seria necessário aumentar em mais de seis vezes nos próximos dez anos para viabilizar o cenário de descarbonização até 2050.
Porém, existem obstáculos importantes para isso, incluindo condições financeiras e fiscais adversas, alto nível de endividamento público e alto custo de capital para projetos de energia limpa. Superar esses problemas exige políticas domésticas mais fortes e apoio internacional.
2. Garantir equilibro nos investimentos, especialmente em infraestrutura
Um sistema descarbonizado não pode depender apenas de energia solar, eólica e veículos elétricos. O avanço do investimento nessas soluções precisa ser complementado por redes de infraestrutura maiores, inteligentes e adaptadas, mais combustíveis de baixa emissão e tecnologias de captura e armazenamento de carbono.
Investimentos em muitas dessas áreas estão atrasados, especialmente na infraestrutura de transmissão e distribuição. Um projeto de geração renovável pode levar anos para obter permissão para conectar-se a rede e esse tempo de espera parece estar aumentando, em vez de diminuir.
No cenário estimado pela IEA, a expansão das linhas de transmissão e distribuição precisa atingir 2 milhões de quilômetros por ano até 2030 e entre 30 mil e 50 mil quilômetros de CO2 precisam ser instalados até a mesma data, junto com novas infraestruturas de hidrogênio.
3. Garantir que a transição energética seja resiliente, inclusiva e financeiramente viável
A transição energética exigirá menos recursos naturais em relação ao atual sistema energético, levando em conta combustíveis fósseis, matérias-primas e minerais críticos. Mas isso não apaga as preocupações relacionadas a segurança energética e mineral.
Conforme a demanda por óleo e gás cai, o suprimento começará a se concentrar em países detentores de grandes reservas, cujas economias são mais vulneráveis a mudanças. Também existem riscos potenciais no suprimento de minerais críticos vitais para fabricação de tecnologias de energia renovável.
Embora os gastos para o desenvolvimento e exploração de minerais críticos tenham aumentado 30% e 20% em 2022, respectivamente, os projetos de mineração anunciados não suficientes para atender as metas até 2030. Cobrir esse vácuo exigirá um forte investimento em mineração, processamento e refino, assim como em reciclagem e inovação tecnológica.
Também será necessário dar atenção para a resiliência das cadeias de suprimento do setor de energia renovável. Atualmente, elas apresentam uma concentração geográfica superior aos combustíveis fósseis, com a China exercendo um papel de destaque.
Esse cenário representa um risco elevado de disrupção, seja por tensões geopolíticas, eventos climáticos extremos ou acidentes industriais. Muitos países agora estão buscando investir na produção local, incluindo equipamentos e minerais críticos.
Os governos também precisam garantir que o processo de transformação funcione para todos, incluindo comunidades vulneráveis cujas vidas serão afetadas por mudanças de combustíveis e tecnologias.
4. Encontrar formas de colaboração entre países
Os países precisarão encontrar maneiras de fazer a descarbonização um esforço unificado. Isso é vital para a expandir o fluxo financeiro para economias em desenvolvimento, para acelerar o desenvolvimento de tecnologias renováveis, para garantir um suprimento de energia acessível e para estabelecer redes de segurança em caso de disrupções.