Aproveitamento do CO2 renovável é visto como chave para acelerar a transição energética e consolidar o país como hub global de e-fuels.
Conteúdo
- Introdução ao Potencial do CO2 Biogênico
- A Vantagem Estratégica do CO2 Biogênico
- Power-to-X e a Criação de E-Fuels
- O Setor Elétrico como Pilar de Insumos para E-Fuels
- O Desafio Regulatório e a Visão de Heloísa Borges
- O Futuro da Descarbonização da Indústria Pesada
- Visão Geral
Introdução ao Potencial do CO2 Biogênico
A Transição Energética no Brasil está prestes a ganhar um novo e poderoso aliado que pode reverter a lógica de poluição e transformar resíduos em riqueza: o CO2 biogênico. Segundo a especialista Heloísa Borges, renomada diretora de estudos de óleo, gás e biocombustíveis, o aproveitamento estratégico desse carbono renovável é a chave para impulsionar a produção de combustíveis sintéticos (ou e-fuels) e acelerar a descarbonização da indústria em setores onde a eletrificação é inviável ou extremamente complexa.
Para os profissionais do setor elétrico, essa visão é um convite para olhar o CO2 biogênico não como um passivo ambiental, mas como um insumo valioso. O Brasil, líder mundial em bioenergia (etanol e biomassa), possui uma vantagem comparativa gigantesca para capturar esse carbono renovável e combiná-lo com o Hidrogênio Verde (H2V), gerando e-fuels essenciais para a aviação, navegação e a indústria pesada. A estratégia é transformar o país em um *hub* global de Power-to-X.
A descarbonização da indústria pesada e do transporte de longa distância é o “último quilômetro” da luta climática. Enquanto carros de passeio podem ser eletrificados facilmente, navios e aeronaves exigem combustíveis líquidos ou gasosos de alta densidade energética. É aqui que os combustíveis sintéticos e o CO2 biogênico brasileiro entram em cena, garantindo a neutralidade de carbono e a competitividade nacional.
A Vantagem Estratégica do CO2 Biogênico
O CO2 biogênico é aquele liberado na atmosfera durante o processamento de matérias-primas orgânicas, como a fermentação do açúcar para produzir etanol ou a queima de biomassa para gerar energia. Ao contrário do CO2 de origem fóssil (petróleo, carvão), o carbono biogênico foi previamente capturado da atmosfera pela planta durante seu crescimento. Portanto, ao ser capturado novamente na fonte e reutilizado, ele fecha o ciclo do carbono, tornando o processo climaticamente neutro ou até mesmo negativo.
A infraestrutura de bioenergia e biocombustíveis já existente no Brasil, especialmente no estado de São Paulo, coloca o país em posição de destaque. Usina de etanol e plantas de celulose liberam grandes volumes de CO2 biogênico em concentrações elevadas e fáceis de serem capturadas. Estima-se que o Brasil possa capturar milhões de toneladas anualmente, transformando esses locais em polos de matéria-prima para a produção de combustíveis sintéticos.
Heloísa Borges defende que essa abundância de CO2 biogênico deve ser vista como um recurso nacional. A combinação desse carbono renovável com o Hidrogênio Verde, produzido a partir de excedentes de energia renovável (eólica e solar), é o cerne da rota Power-to-X que pode revolucionar a nossa descarbonização da indústria.
Power-to-X e a Criação de E-Fuels
A rota Power-to-X (P-t-X) é o processo pelo qual a eletricidade renovável (o ‘Power’) é usada para criar produtos químicos ou combustíveis (o ‘X’). No contexto dos combustíveis sintéticos, o processo chave envolve a eletrólise da água para produzir Hidrogênio Verde, que depois reage com o CO2 biogênico capturado (processo de metanação, Fischer-Tropsch ou síntese de metanol).
O resultado são os e-fuels (combustíveis eletrificados): e-metanol, e-querosene (ou SAF sintético) e e-diesel. Esses combustíveis têm a grande vantagem de serem drop-in, ou seja, podem ser utilizados na infraestrutura de distribuição e nos motores existentes sem grandes adaptações. Isso é crucial para o setor de transporte pesado, que depende de alta densidade de energia e não pode esperar pela eletrificação total.
A produção de e-querosene sustentável para aviação, por exemplo, é uma das maiores demandas globais e uma prioridade para a descarbonização da indústria aeronáutica. O Brasil, com o CO2 biogênico e a energia renovável de baixo custo, pode se tornar um exportador massivo desses novos combustíveis, transformando a crise climática em uma oportunidade econômica.
O Setor Elétrico como Pilar de Insumos para E-Fuels
A visão de Heloísa Borges sobre o CO2 biogênico é inseparável do setor elétrico. Para que a rota Power-to-X funcione, é necessária uma enorme quantidade de Hidrogênio Verde de baixo custo, o que só é possível com a expansão da energia renovável (principalmente eólica e solar). O setor elétrico é, portanto, o principal fornecedor do insumo energético para essa nova descarbonização da indústria.
Os investimentos em grandes projetos de energia renovável, especialmente no Nordeste, precisam ser integrados à demanda industrial de hidrogênio e CO2. O CO2 biogênico age como um catalisador dessa integração, criando uma demanda firme para o H2V e, consequentemente, impulsionando novos projetos de geração. É um ciclo virtuoso de energia renovável e produção industrial.
Além disso, a captura de carbono (CCU) nas plantas de bioenergia cria uma nova fonte de receita para o setor. O CO2, antes um subproduto, torna-se um insumo comercializável, valorizando toda a cadeia de bioenergia e reforçando a sustentabilidade financeira das usinas.
O Desafio Regulatório e a Visão de Heloísa Borges
Para que essa visão se torne realidade, a regulamentação é fundamental. Heloísa Borges aponta para a urgência de o Brasil criar um marco legal robusto para os combustíveis sintéticos. Isso envolve o desenvolvimento de critérios de certificação claros para atestar a origem tanto do H2 (verde) quanto do CO2 (biogênico) utilizado.
O Brasil precisa garantir que seus e-fuels sejam reconhecidos internacionalmente, evitando barreiras comerciais. É necessário definir o que é “adicionalidade” para a energia renovável que alimenta os eletrolisadores e como o CO2 biogênico se encaixa nos mecanismos de incentivo, como o RenovaBio. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e o MME têm um papel crucial nisso.
A regulamentação deve tratar o CO2 biogênico de forma diferenciada em relação ao CO2 fóssil. Incentivos fiscais e créditos de carbono para a captura de carbono (CCU) biogênico são essenciais para viabilizar os primeiros projetos, que ainda enfrentam altos custos de capital e operação para a descarbonização da indústria. A previsibilidade regulatória é o que destravará os bilhões de reais em investimentos necessários para o P-t-X.
O Futuro da Descarbonização da Indústria Pesada e o Potencial dos Combustíveis Sintéticos
O potencial dos combustíveis sintéticos vai além do transporte. O CO2 biogênico pode ser usado para produzir metanol ou amônia verde, insumos cruciais para a descarbonização da indústria de fertilizantes, aço e cimento. Esses setores, intensivos em energia e com emissões de processo difíceis de eliminar, encontram nos e-fuels e no H2V a solução de que precisam.
A projeção de Heloísa Borges é que, ao longo da década, o custo dos combustíveis sintéticos produzidos no Brasil se aproxime da paridade com os fósseis, impulsionado pela queda no preço da energia renovável. Quando isso ocorrer, o CO2 biogênico será o grande diferencial competitivo do Brasil. Não apenas produziremos energia limpa, mas também os combustíveis que o mundo precisa para zerar suas emissões.
O caminho para a descarbonização da indústria via Power-to-X e CO2 biogênico é uma jornada complexa que exige coordenação entre o setor elétrico, o setor de bioenergia e o setor de óleo e gás. A visão de Heloísa Borges é um farol que guia o país para uma Transição Energética de valor agregado, consolidando o Brasil não apenas como um *exportador* de *commodities*, mas como um líder mundial em soluções climáticas e energia renovável. O CO2 biogênico é o ingrediente secreto que transformará a descarbonização em um novo motor de crescimento.
Visão Geral
O aproveitamento do CO2 biogênico, em sinergia com o Hidrogênio Verde gerado por energia renovável, estabelece o Brasil como um polo estratégico na rota Power-to-X. Essa integração, analisada por Heloísa Borges, visa produzir combustíveis sintéticos (e-fuels) essenciais para setores de difícil eletrificação, como aviação e indústria pesada. A concretização dessa vantagem depende de um arcabouço regulatório claro, que valide o carbono renovável e estimule investimentos no setor elétrico e na bioenergia, impulsionando a descarbonização da indústria nacional.























