O Senado Federal aprovou a prorrogação dos contratos das usinas termelétricas a carvão até 2040, gerando controvérsias sobre a política energética e possíveis benefícios a grupos empresariais específicos.
O Plenário do Senado Federal aprovou nesta quinta-feira (30) o Projeto de Lei de Conversão (PLC) n° 10, de 2025, oriundo da Medida Provisória (MPV) n° 1304, de 2025, que promove alterações significativas na legislação do setor elétrico brasileiro. Esta matéria, aprovada em sessão deliberativa extraordinária, segue agora para análise do Presidente da República, que poderá sancioná-la ou vetá-la. A medida visa garantir a continuidade de operação das termelétricas movidas a carvão mineral nacional por um período estendido, o que tem gerado intensos debates no Congresso Nacional. A prorrogação das outorgas por 25 anos e a contratação de reserva de capacidade até 2040 são os pontos centrais que motivaram as discussões acaloradas, com oposição alegando que a aprovação beneficia determinados setores empresariais.
O cerne da controvérsia reside no Capítulo II do texto aprovado, que estabelece condições vantajosas para as usinas termelétricas que utilizam carvão mineral nacional. A legislação determina especificamente a contratação de reserva de capacidade para essas usinas até o final de 2040. Além disso, confere um alongamento de 25 anos nas outorgas de concessão e autorização para a produção independente de energia elétrica por parte desses empreendimentos. Essa regra se aplica a usinas que já consumiam o volume mínimo de carvão nacional estipulado em contratos vigentes em dezembro de 2022, bem como àquelas com Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR) com vencimento previsto até o final de 2028. A medida também inclui uma cláusula que permite a antecipação do descomissionamento de usinas a carvão, seja nacional ou importado, sem incorrer em ônus, mediante solicitação formal à ANEEL com seis meses de antecedência.
Debate acalorado e acusações de benefício dirigido
A tramitação da MPV foi marcada por discussões intensas, onde parlamentares da oposição classificaram as novas regras referentes ao carvão como “jabutis”, ou seja, temas que não possuíam relação direta com o escopo original da medida provisória, e um claro retrocesso na direção da transição energética nacional. O Deputado Danilo Forte expressou forte oposição, ressaltando a ineficiência e o alto índice de emissão de carbono do carvão, contrastando a decisão com o compromisso do Brasil com energias mais limpas em um momento prévio a grandes eventos globais como a COP 30. A preocupação financeira também foi levantada, com o Deputado Marcel Van Hattem acusando que o custo da manutenção dos empregos no setor estaria sendo transferido aos consumidores através de contas de energia mais elevadas, destinadas a subsidiar as usinas de carvão.
As acusações de favorecimento específico ganharam corpo com a menção a grupos empresariais. O Deputado Van Hattem citou reportagens que apontavam o benefício direto a empresários como os irmãos Batista, ligados à J&F Investimentos, proprietária da Usina Termelétrica Candiota III, localizada no Rio Grande do Sul, e também ao empresário Carlos Suarez. A manutenção destas usinas, apesar das metas ambientais, tornou-se o principal ponto de fricção no debate político sobre a legislação elétrica.
Questionamentos Ambientais e o Futuro de Candiota III
A Usina de Candiota III, apontada como a principal beneficiária desta prorrogação de contratos, também está no centro de disputas ambientais e judiciais. O Instituto Internacional ARAYARA formalizou questionamentos ao Senador Randolfe Rodrigues sobre a inclusão das regras para o carvão, ao que ele teria confirmado que o benefício seria direcionado especificamente à UTE Candiota III, pertencente ao grupo J&F. O ARAYARA demonstrou grande preocupação com a fragilidade do argumento de proteção ao emprego, argumentando que a subsídio não oferece garantias em cenários adversos.
Em nota emitida sobre o tema, o Instituto destacou: “Caso a UTE Candiota tenha sua licença não renovada pelo IBAMA em abril de 2026, visto o seu vencimento ou pela ação judiciais que tramitam na Justiça Federal na qual interposta pela Arayara, o trabalhador da cadeia do carvão mineral será demitido e este fato do subsídio não garantirá o seu emprego e nem configura como uma transição energética justa”, afirmou John Wurdig, do Observatório do Carvão do Instituto, que esteve presente na sessão do Senado. O Instituto continua a mover ações na Justiça Federal questionando a validade da licença ambiental da usina.
Defesa do relator: empregos e social
Em sua defesa das novas regras, o relator da MPV, Senador Eduardo Braga (MDB-AM), enfatizou que a inclusão das cláusulas visava a proteção social e econômica, citando especificamente a cidade de Candiota (RS), onde cerca de 7 mil empregos estariam em risco. Braga esclareceu que o texto não era sua proposta inicial, mas sim resultado de uma emenda (nº 0037) apresentada pelo Senador Esperidião Amin. O Senador Luis Carlos Heinze também ofereceu seu suporte ao relator, ressaltando que a medida era crucial para harmonizar o prazo de funcionamento das usinas do Rio Grande do Sul com o de Santa Catarina, que já possuía previsão de operação estendida até 2040. Isso mostra um alinhamento regional buscado no Congresso Nacional.
Durante as complexas negociações na Comissão Mista, o Senador Braga articulou uma manobra estratégica para garantir o avanço da pauta do carvão. Ele optou por separar a discussão sobre as termelétricas a gás, que enfrentavam a possibilidade de um veto presidencial em análise no Congresso, assegurando que esse tópico não obstruísse a votação da MPV principal. Com a aprovação no Senado, o Projeto de Lei de Conversão segue agora para a sanção presidencial, momento em que as regras de extensão das usinas a carvão poderão efetivamente se tornar lei.






















