O curtailment ameaça a transição energética, forçando o desperdício de energia renovável e exigindo soluções estratégicas imediatas.
Conteúdo
- O Paradoxo do Desperdício e o Aumento do Curtailment
- Custo Real do Desperdício e o Descompasso de Infraestrutura
- Agências Reguladoras em Campo por Soluções Sistêmicas
- A Solução Está nas Baterias e Sistemas de Armazenamento de Energia
- O Novo Mapa do Tesouro: Oportunidades de Negócio
- A Transição Já Começou e a Necessidade de Mudança
- Visão Geral
O Paradoxo do Desperdício e o Aumento do Curtailment
O fenômeno conhecido como curtailment representa um sério entrave para a sustentabilidade da nossa transição energética. Este cenário ocorre quando a capacidade de geração de energia renovável ultrapassa a infraestrutura de rede disponível ou a demanda instantânea do sistema, forçando os operadores a implementar o “desligamento” de usinas. Na prática, isso significa descartar eletricidade limpa que poderia ser utilizada. As projeções da Wood Mackenzie indicam um agravamento alarmante no Brasil, estimando que a taxa média de curtailment no Sistema Interligado Nacional (SIN) pode triplicar até 2035, passando de 2% para 8%. O cenário no Nordeste, polo de geração renovável, é ainda mais crítico, com projeções atingindo 11% de corte médio, reforçando a urgência de abordar este desperdício de energia.
Custo Real do Desperdício e o Descompasso de Infraestrutura
O impacto financeiro do curtailment é substancial, resultando em perdas estimadas de R$ 1,7 bilhão no setor, embora o Operador Nacional do Sistema (ONS) reconheça apenas uma fração disso. A discrepância metodológica faz com que grande parte dos prejuízos permaneça invisível nas métricas oficiais. Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar, aponta o curtailment como o maior desafio enfrentado pelas renováveis no país, destacando que a raiz do problema reside na infraestrutura física: entre 25% a 33% dos cortes ocorrem por insuficiência de linhas de transmissão, e outros 25% por fragilidade da rede elétrica. A expansão de 76 GW em novas usinas renováveis nos próximos anos contrasta drasticamente com o ritmo lento da modernização da rede, criando um descompasso que afeta a confiança dos investidores e a viabilidade de novos projetos.
Agências Reguladoras em Campo por Soluções Sistêmicas
Diante da crescente ameaça ao setor, as agências reguladoras brasileiras intensificaram as discussões sobre mecanismos de mitigação. A ANEEL tem promovido encontros com associações e grandes bancos para debater a Consulta Pública 45/2019, focada em estabelecer um mecanismo de rateio dos efeitos dos cortes, buscando aliviar as dificuldades financeiras dos agentes. Este tipo de ação é vital para restaurar a confiança necessária para novos aportes financeiros, visto que a BloombergNEF aponta para uma redução nos investimentos e dificuldades de financiamento para projetos centralizados. Além disso, a ANEEL avança na regulamentação de sistemas de armazenamento de energia (Consulta Pública 39/2023), explorando modelos inovadores como o “empilhamento de receitas” (stacking revenues). O CNPE também autorizou a inclusão de compensadores síncronos, enquanto a EPE planeja investimentos de R$ 56 bilhões em 15.000 novos quilômetros de linhas de transmissão, com previsão de operação entre 2028 e 2030, visando maior robustez da rede elétrica.
A Solução Está nas Baterias e Sistemas de Armazenamento de Energia
Embora a expansão da transmissão seja fundamental, os sistemas de armazenamento de energia por baterias (BESS) são apontados como a solução definitiva para o paradoxo energético brasileiro. O armazenamento permite capturar o excedente de geração, especialmente solar e eólica, e disponibilizá-lo quando a demanda atinge o pico. Fernando Dorand da Wood Mackenzie afirma que o armazenamento transcende a opção, tornando-se essencial para converter energia desperdiçada em receita via arbitragem de preços e prestação de serviços à rede. O mercado BESS no Brasil demonstra um crescimento exponencial: a demanda por equipamentos cresceu 89% em 2024, com projeções de R$ 23 bilhões em investimentos até 2030. O país já alcançou 852 MWh de potência total instalada, e o mercado latino-americano de armazenamento deve atingir 23 GW até 2034, com o Chile servindo de referência regulatória.
O Novo Mapa do Tesouro: Oportunidades de Negócio
O curtailment, apesar de desafiador, desenha um novo panorama de oportunidades para empreendedores e investidores no setor elétrico. A primeira grande tendência são os projetos híbridos de solar + armazenamento, que se tornam o novo padrão para maximizar receitas por meio de arbitragem de preços e serviços ancilares, aproveitando a regulamentação de “empilhamento de receitas”. Em segundo lugar, a agregação de cargas, como os 18 projetos de hidrogênio verde (H2V) no Nordeste, pode absorver excedentes próximos à fonte, eliminando problemas de transmissão. Terceiro, mecanismos de mercado inovadores, como preços negativos e leilões de curtailment, criam nichos para plataformas de tecnologia e serviços de agregação de demanda. O armazenamento distribuído é outro mercado robusto, avaliado em R$ 22,5 bilhões, focado em confiabilidade energética para o setor C&I. Por fim, o Vehicle-to-Grid (V2G) aponta para a próxima fronteira, incentivando o desenvolvimento de tecnologia para carros elétricos atuarem como baterias móveis, uma oportunidade para quem se posicionar antes da consolidação regulatória.
A Transição Já Começou e a Necessidade de Mudança
O mercado já sinaliza uma readequação estrutural frente aos limites impostos pelo curtailment e pela infraestrutura. A adição de capacidade solar de grande escala em 2025 caiu mais de 50% em comparação com 2024, indicando uma desaceleração da expansão de projetos puramente solares. Paralelamente, observa-se um aumento compensatório na geração térmica, refletindo a prioridade do sistema em manter a confiabilidade da rede elétrica, mesmo que a um custo ambiental maior. Essa mudança força o setor a migrar para soluções mais flexíveis, como os projetos híbridos e a geração distribuída. O armazenamento de energia surge como a alternativa mais limpa e eficiente para oferecer a estabilidade que o sistema busca, evitando que o foco na expansão da capacidade renovável resulte em desperdício contínuo.
Visão Geral
O paradoxo energético brasileiro exige uma resposta imediata e estratégica, onde a aceitação do desperdício crescente não é mais sustentável, como alertado pelo ONS. A janela de oportunidade para o armazenamento de energia é agora, impulsionada por projeções de R$ 23 bilhões em investimentos e uma regulação em desenvolvimento. A escolha é clara: persistir em um modelo descoordenado ou abraçar o armazenamento para construir um sistema mais resiliente. Empreendedores e investidores que se posicionarem estrategicamente em projetos híbridos, desenvolvimento de tecnologia para agregação de demanda ou soluções BESS estarão na vanguarda da próxima década do setor elétrico. O sucesso da transição energética depende da inteligência na gestão da energia, e a solução para o curtailment é a maior oportunidade de negócio disponível no momento, definindo quem construirá o futuro do mercado energético brasileiro.
