Apesar da seca, o Sistema Interligado Nacional mantém a estabilidade graças à diversificação da matriz e ao despacho estratégico de usinas complementares.
Conteúdo
- A Severidade da Precipitação: Piores da Série Histórica
- O Efeito Amortecedor das Renováveis (Eólica e Solar)
- O Alto Preço da Segurança Energética: O Despacho das Térmicas
- Reservatórios Preservados: A Estratégia de Estoque
- O Futuro Híbrido: A Nova Dependência do SIN
- Visão Geral
A Severidade da Precipitação: Piores da Série Histórica
O Sistema Interligado Nacional (SIN) enfrenta uma das piores séries de precipitação de sua história recente, um cenário que, há apenas uma década, seria sinônimo de crise energética iminente, racionamento e pânico no Setor Elétrico. No entanto, a realidade atual contrasta com a memória histórica: apesar da chuva fraca, os reservatórios das hidrelétricas estão mantendo níveis de armazenamento satisfatórios. Essa estabilidade não é um milagre hidrológico, mas sim o resultado direto da transformação profunda da matriz brasileira, impulsionada pelo crescimento massivo de Renováveis não-hídricas e pelo despacho estratégico de Térmicas.
A preservação dos reservatórios em meio a uma seca histórica demonstra a nova resiliência do sistema. O Brasil deixou de ser refém exclusivo da precipitação. A diversificação da matriz elétrica, com a entrada de volumes significativos de Geração Renovável e a pronta resposta das Termelétricas, permitiu ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) gerenciar a escassez hídrica sem depender da produção hidráulica. É a prova de que o planejamento dos últimos anos está, finalmente, colhendo frutos de segurança energética.
Os dados do ONS são incisivos. A precipitação em diversos subsistemas do SIN, particularmente no Sudeste/Centro-Oeste – que concentra a maior capacidade de armazenamento do país –, situou-se em patamares historicamente baixos. Em algumas bacias críticas, o volume de Energia Natural Afluente (ENA) registrado está entre os piores já observados nos últimos 90 anos de medição contínua.
Essa condição de chuva fraca persistente, alimentada por fenômenos climáticos globais e regionais, expõe a vulnerabilidade do modelo centrado em hidroeletricidade. Contudo, ao contrário de crises anteriores (como 2001 ou o período crítico de 2021), o nível de Reservatórios não acompanha a queda da precipitação. Isso se deve à Inteligência de Mercado e às decisões operacionais que priorizaram a preservação da água como estoque estratégico.
O ONS tem atuado com cautela. A diretriz é clara: minimizar o uso da água para geração enquanto houver alternativas viáveis e economicamente justificáveis. A precipitação baixa é o trigger que aciona o novo arsenal de Geração disponível no SIN.
O Efeito Amortecedor das Renováveis (Eólica e Solar)
O principal fator que desacoplou a queda da precipitação do esgotamento dos reservatórios é o avanço das Renováveis intermitentes, notadamente a eólica e a solar. A capacidade instalada dessas fontes de energia limpa cresceu exponencialmente nos últimos anos, especialmente nas regiões Nordeste e Sudeste.
A geração eólica e solar atingem seus picos em momentos estratégicos. A solar injeta energia durante o dia, reduzindo a demanda por despacho hidráulico na parte da tarde. Já a eólica, com a força dos ventos no Nordeste, tem entregado volumes recordes, que chegam a responder por mais de 20% da carga em alguns períodos.
Essa Geração Renovável não-hídrica atua como um “colchão”, absorvendo a demanda que, em tempos passados, seria integralmente coberta pelas hidrelétricas. O ONS pode, portanto, poupar a água dos reservatórios, já que a eletricidade está sendo suprida por fontes que não dependem da chuva para operar. Essa diversificação é a materialização da Transição Energética.
O Alto Preço da Segurança Energética: O Despacho das Térmicas
Embora as Renováveis tenham assumido o papel de liderança, o sistema ainda necessita de lastro firme e despachável para garantir a segurança energética, principalmente nos momentos de baixa intermitência. É aí que entra o despacho estratégico das Termelétricas.
O ONS tem acionado usinas movidas a gás natural, diesel e carvão para cobrir a diferença entre a Geração Renovável e a demanda total. Essa decisão, embora eleve o Custo Marginal de Operação (CMO) e a tarifa para o consumidor, é essencial para manter o nível dos Reservatórios. A água que seria gasta hoje na geração hidráulica é guardada para o futuro, protegendo o país de um possível colapso em meses de seca ainda mais severa.
O custo do despacho térmico é o preço da resiliência. O Setor Elétrico pondera o gasto imediato com o combustível fóssil contra o risco de um deficit energético, que seria infinitamente mais caro para a economia. A decisão de usar as Térmicas é uma política de seguro contra a precipitação historicamente baixa.
Reservatórios Preservados: A Estratégia de Estoque
A principal evidência do sucesso da estratégia de diversificação e despacho é o nível dos reservatórios. Apesar da precipitação entre as piores da série histórica, as bacias se mantêm em patamares médios que garantem a segurança energética para o próximo período de chuva fraca.
A preservação do armazenamento é crucial porque a água nos reservatórios funciona como a única fonte de geração que pode ser acionada sob demanda, a qualquer hora do dia ou da noite, com alta precisão e baixo custo variável (após o investimento inicial). É o pilar do planejamento de longo prazo.
Manter os reservatórios em níveis confortáveis oferece ao ONS flexibilidade operacional. Isso permite que o Brasil consiga lidar com picos de carga inesperados, como os gerados por ondas de calor recentes, sem entrar em colapso. Os reservatórios tornaram-se o grande regulador da volatilidade da Geração Renovável.
O Futuro Híbrido: A Nova Dependência do SIN
A experiência de operar o SIN com precipitação historicamente baixa, mas com reservatórios estáveis, redefine a dependência do sistema. O Brasil está se tornando menos dependente da chuva e mais dependente de uma gestão complexa e coordenada de fontes híbridas.
O sucesso na preservação dos reservatórios exige agora que os investimentos se voltem para a infraestrutura que suporta essa nova matriz. O escoamento da energia limpa exige mais linhas de transmissão, e a segurança energética de longo prazo demandará soluções de armazenamento de energia (baterias), que podem substituir parte do despacho térmico e aumentar a sustentabilidade da operação.
A Transição Energética brasileira provou sua validade ao transformar a ameaça de uma das piores séries históricas de precipitação em uma demonstração de resiliência. O Setor Elétrico agora opera em um novo paradigma: os reservatórios são o cofre de segurança energética, e as Renováveis são a nova base da geração do país. O desafio é manter o planejamento atento para garantir que os Custos Operacionais não se tornem insustentáveis no futuro.
Visão Geral
O Sistema Interligado Nacional (SIN) demonstra notável resiliência frente à pior chuva fraca da série histórica. A estabilidade dos reservatórios, combinada ao avanço das Renováveis (eólica e solar) e ao despacho tático de Térmicas, garante a segurança energética, protegendo os estoques hídricos e sinalizando uma nova era de diversificação na matriz elétrica brasileira.























