O CNPE exige que BNDES e Eletronuclear revisitem os estudos de Angra 3, focando na modelagem econômico-financeira para definir o futuro da usina.
Conteúdo
- A Resolução CNPE: O Que o Governo Realmente Pediu
- A Estratégia por Trás da Energia Firme
- Angústia de Angra: O Histórico de Uma Década Perdida
- O Papel Decisivo do BNDES na Estruturação
- Implicações para o Mercado de Energia Limpa
- A Contagem Regressiva para a Decisão de 2025
A Resolução CNPE: O Que o Governo Realmente Pediu
A resolução do CNPE é clara e objetiva. Ela não determina a conclusão das obras de Angra 3, mas sim a revalidação rigorosa dos dados. O foco principal está na modelagem econômico-financeira, uma etapa crucial que visa calcular o custo de capital atualizado, o cronograma realista e, fundamentalmente, a tarifa de referência mínima que a energia nuclear gerada por Angra 3 precisaria para ser economicamente viável.
O BNDES entra como o grande estruturador financeiro. Sua missão é, em conjunto com a Eletronuclear, traçar cenários que envolvam a captação de recursos, seja via project finance, entrada de novos sócios privados ou financiamento misto. A necessidade de atualizar os estudos é urgente, pois a última estimativa robusta data de anos atrás, e a inflação e a taxa de câmbio impactaram significativamente o custo final da energia nuclear.
A Eletronuclear, responsável pela operação e know-how técnico, deve fornecer os dados atualizados sobre o estado atual da usina, o tempo necessário para a retomada segura da construção e a integração dos equipamentos que já foram comprados e estão estocados. O prazo para a entrega destes estudos é apertado, com o Ministro de Minas e Energia já sinalizando o desejo de uma definição até o final de 2025.
A Estratégia por Trás da Energia Firme
Em um país que prioriza a energia limpa intermitente (eólica e solar), o papel da energia nuclear como fonte de energia firme de base é inegável. Angra 3, quando concluída, adicionaria 1.405 MW de potência ao Sistema Interligado Nacional (SIN), operando 24 horas por dia, 7 dias por semana, sem emissão direta de gases de efeito estufa.
Essa capacidade é vista pelo CNPE como um fator de segurança energética, especialmente importante para compensar a intermitência das renováveis e reduzir a dependência de termelétricas a gás e óleo, que são mais caras e poluentes. A decisão do Governo de reavaliar Angra 3 reflete uma visão de longo prazo sobre a necessidade de descarbonização combinada com estabilidade do suprimento.
O debate, contudo, é acalorado. Críticos da energia nuclear apontam os riscos de acidentes, o problema do descarte de resíduos radioativos e o altíssimo custo de capital. Para cada dólar investido em Angra 3, muitos argumentam, mais capacidade eólica ou solar poderia ser instalada em menos tempo, reforçando a transição energética.
Angústia de Angra: O Histórico de Uma Década Perdida
As obras de Angra 3 começaram em 1984, foram paralisadas, retomadas em 2010 e interrompidas novamente em 2015, em meio à Operação Lava Jato e graves denúncias de corrupção. O abandono de estruturas e o desgaste de equipamentos já representaram um custo de bilhões de reais para os cofres públicos.
A incerteza sobre a modelagem econômico-financeira reside em quanto custará, de fato, terminar o que falta. Estima-se que mais de R$ 20 bilhões ainda precisariam ser investidos na conclusão das obras, além dos custos já irrecuperáveis. A Eletronuclear precisa demonstrar, nos novos estudos, que é capaz de gerir o restante do projeto dentro de um orçamento e um prazo realistas, recuperando a confiança do mercado.
O novo mandato do CNPE exige que o BNDES e a Eletronuclear considerem todos os riscos associados ao histórico de má gestão. A transparência dos novos estudos será fundamental para legitimar qualquer decisão subsequente de investimento ou abandono, evitando que a usina continue a ser um dreno de recursos públicos.
O Papel Decisivo do BNDES na Estruturação
O envolvimento direto do BNDES é a garantia de que a modelagem econômico-financeira será feita com o rigor necessário para atrair investimento privado. O Banco não apenas fornecerá análises de crédito, mas também buscará a melhor estrutura para reduzir o risco do Governo e da Eletronuclear.
Uma das possibilidades aventadas nos bastidores é a busca por um parceiro privado, possivelmente internacional, que assuma uma participação significativa na usina em troca de um fornecimento garantido de energia nuclear. O BNDES deverá modelar esse cenário, incluindo a potencial privatização parcial da Eletronuclear ou a criação de uma SPE (Sociedade de Propósito Específico) para Angra 3.
Se o custo for muito elevado, resultando em uma Tarifa de Energia de Angra 3 (TEANG) inaceitável para o consumidor, os estudos do BNDES deverão apresentar o custo do abandono, incluindo o desmonte e a preservação das estruturas existentes, um cenário complexo e igualmente custoso.
Implicações para o Mercado de Energia Limpa
Embora Angra 3 seja uma fonte de energia nuclear, ela concorre por capital e por espaço na matriz com as renováveis. O montante de R$ 20 bilhões para a conclusão das obras poderia financiar centenas de projetos solares e eólicos, fortalecendo a transição energética descentralizada.
A inclusão da energia nuclear no debate sobre segurança energética sinaliza que o Governo está disposto a tolerar um custo mais alto por megawatt para garantir a firmeza e a estabilidade da rede. Profissionais de sustentabilidade e economia energética estão atentos: se os estudos justificarem a conclusão das obras, a matriz brasileira poderá se beneficiar da complementaridade da energia nuclear com a energia limpa.
A decisão do CNPE não é um endosso irrestrito à nuclear, mas um pedido para que a Eletronuclear e o BNDES apresentem a “conta” final de forma transparente. Só com números sólidos e uma modelagem econômico-financeira robusta o Governo poderá tomar uma decisão estratégica que equilibre custo, segurança energética e sustentabilidade.
A Contagem Regressiva para a Decisão de 2025
O relógio está correndo. Com a pressão do CNPE e do MME (Ministério de Minas e Energia) para uma definição ainda em 2025, os próximos meses serão de intensa atividade nos escritórios da Eletronuclear e do BNDES. A comunidade de energia limpa e os *stakeholders* do Setor Elétrico devem monitorar de perto cada passo.
A resolução do CNPE é um catalisador. Ela força o Governo a confrontar a herança de Angra 3 e a definir o futuro da energia nuclear no Brasil. Seja pela conclusão das obras, que garantiria uma robusta injeção de energia firme, ou pelo abandono definitivo, o resultado desses estudos definirá uma nova era na modelagem econômico-financeira da infraestrutura energética nacional.