A exclusão do “Roadmap para o abandono dos combustíveis fósseis” na COP30 gera incerteza crítica para o setor elétrico e a previsibilidade da transição energética global.
### Conteúdo
- COP30 e a Exclusão do Roadmap Fóssil
- Implicações no Planejamento do Setor Elétrico
- A Batalha Pela Rota da Descarbonização e o Acordo de Paris
- O Dilema do Gás Natural na Transição Justa
- Os Impactos no Setor Elétrico Brasileiro
- O Dilema do Anfitrião e a Diplomacia do Clima
- O Cenário Econômico: Risco e Oportunidade na Ausência do Roadmap
COP30 e a Exclusão do Roadmap Fóssil na Decisão Mutirão
A COP30, realizada em Belém, se transformou em um caldeirão de tensões climáticas e econômicas. No epicentro dessa ebulição está a confirmação feita pelo presidente da Conferência, embaixador André Corrêa do Lago, de que o aguardado “Roadmap para o abandono dos combustíveis fósseis” ficou de fora da proposta de acordo final, batizada de Decisão Mutirão. Esta exclusão não é apenas uma nota de rodapé diplomática; é um abalo sísmico na previsibilidade da transição energética global, com reflexos imediatos para o setor elétrico e a economia de baixo carbono.
A audiência especializada do setor elétrico precisa entender que este impasse afeta diretamente o planejamento de longo prazo. A ausência de um Roadmap dos Combustíveis Fósseis claro e vinculante elimina uma sinalização crucial para investidores em energias limpas. Sem a certeza do cronograma de desativação dos ativos poluentes, o risco regulatório e de mercado para novos projetos de eólica, solar e hidrogênio verde aumenta consideravelmente.
A Batalha Pela Rota da Descarbonização
O termo “Roadmap dos Combustíveis Fósseis” não se refere apenas a uma vaga intenção. Ele representa um cronograma detalhado, com metas intermediárias de redução de produção e consumo de carvão, petróleo e gás natural, culminando em uma eliminação gradual, mas definida. Esta rota é vista por nações mais ambiciosas e vulneráveis como o único caminho viável para manter o aquecimento global abaixo do limite crítico de 1,5°C estabelecido pelo Acordo de Paris.
A Decisão Mutirão brasileira, que deveria ser o documento final consensual da COP30, foi concebida para unir ambição e realidade. No entanto, ao deixar de fora o mapa detalhado para o fim dos fósseis, ela frustrou uma ampla coalizão de países, incluindo a União Europeia e cerca de 80 nações em desenvolvimento. Eles pedem, insistentemente, clareza sobre o futuro da matriz energética.
O Dedo na Ferida: Gás Natural e Transição Justa
Para o profissional de energia, a ausência do roadmap lança incertezas sobre o papel do gás natural. Muitos países, incluindo o Brasil, veem o gás como uma “energia de transição” essencial para dar suporte à intermitência das renováveis. Contudo, sem um roteiro global, o gás pode ser usado como uma âncora para estender a vida útil dos combustíveis fósseis, em vez de ser uma ponte para as energias limpas.
A Confirmação de Corrêa do Lago de que este tema, o mais controverso de toda a negociação, seria relegado a outro fórum ou decisão futura, demonstra a profunda polarização geopolítica. Produtores de petróleo e gás, como Arábia Saudita e nações do G-77 (que inclui o Brasil), resistem ferozmente a qualquer texto que determine a “eliminação” (phase-out) em vez da “redução” (phase-down).
Os Impactos no Setor Elétrico Brasileiro
O setor elétrico brasileiro, que se orgulha de sua matriz majoritariamente limpa, não está imune a essa indefinição. A pressão internacional por um Roadmap mais rígido influenciaria diretamente as decisões de infraestrutura nacional. Investimentos em termelétricas a gás, planejados para garantir a segurança do sistema em períodos de seca hídrica, estariam sob um escrutínio muito maior se houvesse uma data global de corte definida.
A comunidade de sustentabilidade e finanças espera que as políticas públicas sigam a ciência, independentemente do texto final da COP30. A verdade é que a falta de um plano formal global não impede que fundos de investimento, bancos de desenvolvimento e grandes players do mercado adotem suas próprias políticas de descarbonização, desinvestindo proativamente em ativos fósseis.
O Dilema do Anfitrião e a Diplomacia do Clima
A posição de Corrêa do Lago, como presidente da COP30, reflete o delicado malabarismo diplomático do Brasil. O país precisa conciliar sua liderança em energias renováveis e florestas com sua crescente exploração de petróleo e gás na Margem Equatorial. Essa dualidade complexa torna a adoção de um roadmap restritivo um desafio político interno.
O embaixador argumenta que o processo decisório da ONU requer consenso, e que forçar a inclusão do roadmap resultaria no colapso da Decisão Mutirão, repetindo impasses históricos. O foco, segundo a presidência, deve ser em outras áreas cruciais, como financiamento climático e a adaptação, onde um acordo é mais tangível.
O Cenário Econômico: Risco e Oportunidade na Ausência do Roadmap dos Combustíveis Fósseis
Para os economistas do setor, a incerteza regulatória é o maior custo. A ausência de um Roadmap dos Combustíveis Fósseis global dificulta a precificação do carbono futuro. Isso pode levar a decisões de investimento subótimas, mantendo capital alocado em infraestruturas de alto carbono que se tornarão “ativos encalhados” (stranded assets) no médio prazo, à medida que a pressão por sustentabilidade aumenta organicamente.
Por outro lado, essa lacuna na governança global pode ser uma oportunidade para os players mais inovadores. Empresas e países que avançam por conta própria na transição energética, mesmo sem um acordo global forte, se posicionam como líderes de mercado, atraindo capital focado em Environmental, Social, and Governance (ESG) e capturando o valor da previsibilidade e da imagem de liderança.
O apelo de Corrêa do Lago para que o consenso seja alcançado, mesmo que imperfeito, revela a urgência de sair de Belém com um documento que reforce o Acordo de Paris. Ele afirma que “se não reforçarmos o Acordo de Paris, todos vão perder”. Esse alerta ressoa no setor elétrico, onde a inação climática se traduz em eventos extremos, afetando a infraestrutura de transmissão e a segurança da geração.
A despeito da polêmica da exclusão do roadmap, o compromisso com a transição energética é uma realidade técnica e econômica inevitável. O mercado de energias limpas continua a crescer exponencialmente, impulsionado pela paridade de custos e demanda social. A Decisão Mutirão pode não ter o cronograma desejado, mas o futuro do setor elétrico será, indiscutivelmente, movido a fontes renováveis. A batalha agora se move do plenário da COP30 para as salas de conselho e os gabinetes de planejamento estratégico de cada empresa de energia.
Visão Geral
A não inclusão do roteiro detalhado para o fim dos combustíveis fósseis na Decisão Mutirão da COP30, confirmada por Corrêa do Lago, sinaliza um revés na ambição climática. Tal omissão afeta diretamente a previsibilidade de investimentos em energias limpas e impõe desafios regulatórios ao setor elétrico, forçando o mercado a buscar a transição energética com base em iniciativas privadas e pressão de sustentabilidade, em vez de um mandato global claro.






















