A recente derrubada de vetos presidenciais ao marco do licenciamento ambiental ameaça a segurança jurídica e a agenda de sustentabilidade do setor elétrico nacional.
Conteúdo
- Introdução à Análise do Novo Marco Legal
- O Desmonte: Quais Vetos Foram Derrubados no Licenciamento Ambiental?
- O Efeito Colateral no Setor Elétrico e a Energia Limpa
- O Paradoxo da Transição Energética: Velocidade vs. Rigor
- Risco de Greenwashing e Credibilidade Externa no Investimento
- O Próximo Capítulo: O Papel da ANEEL e o Judiciário
- Visão Geral
Introdução à Análise do Novo Marco Legal do Licenciamento Ambiental Brasileiro
A transição energética brasileira acaba de receber um golpe de efeito colateral. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, não poupou palavras ao classificar a recente derrubada de vetos presidenciais ao Projeto de Lei (PL) 2159/2021 — o novo marco legal do licenciamento ambiental brasileiro — como uma “demolição”. A forte declaração reflete a preocupação de que a flexibilização regulatória excessiva, votada pelo Congresso, possa desmantelar a proteção ambiental e injetar instabilidade jurídica em projetos estratégicos do setor elétrico.
Para profissionais de energia limpa e sustentabilidade, o tema é crucial. De um lado, há a necessidade urgente de acelerar a implantação de infraestrutura para suportar o crescimento explosivo da geração eólica, solar e de transmissão. De outro, está o risco de que a simplificação apressada do licenciamento ambiental brasileiro crie passivos ambientais e abra precedentes perigosos, comprometendo a credibilidade ESG dos empreendimentos.
O Desmonte: Quais Vetos Foram Derrubados no Licenciamento Ambiental?
A derrubada de vetos foi cirúrgica, mas de impacto devastador, segundo a avaliação de Marina Silva. O PL 2159/2021, que tramitava há anos, propõe um novo regime de licenciamento ambiental brasileiro, padronizando processos em todo o país. O governo havia vetado dispositivos que, na visão do Ministério do Meio Ambiente, ofereciam “risco inaceitável” à proteção de biomas sensíveis.
Os vetos derrubados pelo Congresso incluem a dispensa de licenciamento ambiental para uma série de atividades e a adoção da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) de forma ampla, um mecanismo de autodeclaração que, para críticos, é insuficiente para grandes obras. Essa licença simplificada é a maior preocupação no âmbito da sustentabilidade.
O resultado da derrubada de vetos é que categorias inteiras de projetos de infraestrutura agora estão isentas do crivo rigoroso do licenciamento ambiental. Essa flexibilização, embora defendida por setores da infraestrutura como um alívio à burocracia, representa um risco de judicialização a longo prazo, pois a fragilidade do processo pode ser contestada em tribunais.
O Efeito Colateral no Setor Elétrico e a Energia Limpa
A área de energia limpa é particularmente afetada pelo novo marco. Entre os vetos derrubados, há pontos cruciais que impactam diretamente a construção de usinas e linhas de transmissão. O setor elétrico sempre argumentou que o licenciamento ambiental brasileiro era o principal gargalo para o escoamento de energia renovável.
Especificamente, a dispensa de licenciamento ambiental para pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e projetos de geração distribuída de até 5 MW foi um dos pontos de discórdia. Enquanto a geração distribuída (solar em telhados) é de baixo impacto, isentar PCHs, que alteram cursos d’água e biomas sensíveis, gera profunda controvérsia entre os especialistas em sustentabilidade.
A derrubada de vetos também pode acelerar o processo para linhas de transmissão, que são vitais para conectar os vastos complexos de energia limpa do Nordeste ao Sudeste. Contudo, essa aceleração pode vir ao custo de um estudo superficial sobre a fragmentação de ecossistemas e a interferência em terras indígenas e quilombolas, um risco real de judicialização.
O Paradoxo da Transição Energética: Velocidade vs. Rigor
O debate central do licenciamento ambiental brasileiro reside no paradoxo da transição energética: como construir rapidamente a infraestrutura verde necessária para descarbonizar a matriz sem destruir o capital natural? O setor elétrico tem um cronograma apertado, mas a legislação agora flexibilizada pode ser vista como um atalho perigoso.
A segurança jurídica para o investimento em clean energy depende da solidez dos estudos ambientais. Se um projeto for construído sob um licenciamento ambiental fraco ou questionável (como os gerados pela LAC em áreas sensíveis), ele se torna um alvo fácil para ações civis públicas, paralisando a obra e gerando prejuízos.
A ministra Marina Silva sublinhou que a legislação, da forma como foi aprovada, ignora a complexidade e a diversidade dos biomas brasileiros. A aplicação de uma regra única, flexível e padronizada para empreendimentos na Amazônia, no Cerrado e na Mata Atlântica é tecnicamente imprudente e demonstra uma falta de sustentabilidade sistêmica.
Risco de Greenwashing e Credibilidade Externa no Investimento
Para empresas de energia limpa que buscam capital estrangeiro e fundos de investimento alinhados a princípios ESG (Ambiental, Social e Governança), a flexibilização do licenciamento ambiental brasileiro pode ser um tiro no pé. Investidores internacionais exigem alto rigor na avaliação de risco social e ambiental.
Se o Brasil é percebido como um país que deliberadamente enfraquece suas salvaguardas ambientais para acelerar a construção de infraestrutura, isso pode levar a um custo de capital mais alto para projetos de clean energy. O risco de judicialização e o risco de reputação associado ao desmonte ambiental são penalidades invisíveis, mas financeiramente reais.
A derrubada de vetos contradiz a promessa do governo brasileiro de restaurar a credibilidade ambiental no cenário global. Enquanto o país tenta atrair investimento maciço para transição energética, o enfraquecimento das regras ambientais mina a confiança no compromisso de sustentabilidade.
O Próximo Capítulo: O Papel da ANEEL e o Judiciário
Com a promulgação da lei, o campo de batalha migra para duas frentes. Primeiro, para a ANEEL e outros órgãos reguladores setoriais, que precisarão interpretar as novas regras e tentar minimizar os danos em suas regulamentações internas, estabelecendo critérios mínimos de sustentabilidade onde a lei federal se calou.
Segundo, o Judiciário será acionado. É quase certo que a fragilidade do novo licenciamento ambiental brasileiro será objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) no Supremo Tribunal Federal (STF). O ambiente de incerteza criado pela derrubada de vetos presidencial afetará a segurança jurídica para o investimento por tempo indeterminado.
A fala de Marina Silva, que descreveu o ato como uma “demolição”, é um chamado de atenção para o setor elétrico. A pressa em construir a transição energética não pode justificar a destruição das regras que protegem o meio ambiente. O futuro da energia limpa no Brasil precisa ser construído sobre bases sólidas de sustentabilidade e rigor regulatório, e não sobre a fragilidade de um licenciamento ambiental brasileiro desfigurado. O desafio agora é evitar que a “demolição” resulte em projetos paralisados por disputas ambientais.
Visão Geral
A derrubada de vetos ao PL 2159/2021 simplifica perigosamente o licenciamento ambiental brasileiro, gerando temores de passivos ambientais e instabilidade jurídica. Embora o setor elétrico vise acelerar a transição energética e a implantação de energia limpa, a flexibilização excessiva, especialmente via LAC, ameaça a credibilidade ESG e pode elevar o custo de capital, forçando o Judiciário e a ANEEL a intervir para garantir a sustentabilidade dos projetos.





















