Conteúdo
- O Fantasma do Curtailment e o Risco Financeiro
- Os Pontos Cegos da Lei e os Desafios para a Regulamentação
- Metodologia de Cálculo: O Novo Quebra-Cabeça da ANEEL
- Risco de Judicialização e a Segurança Jurídica
- O Papel do ONS e a Gestão da Intermitência
- Visão Geral
O Fantasma do Curtailment e o Risco Financeiro
Para o setor elétrico, curtailment é o termo técnico para a restrição ou corte da geração de energia por parte de usinas (principalmente energia eólica e solar) devido a gargalos na rede de transmissão, segurança operacional ou sobrecarga. Em um sistema com crescente penetração de fontes intermitentes, o curtailment tem se tornado mais frequente e oneroso.
O cerne da questão é que a Lei 15.269/2025 reconhece que a perda de receita decorrente do corte não deve ser suportada unicamente pelo gerador. Isso é um reconhecimento da falha sistêmica: o gerador construiu a usina e cumpriu a sua parte, mas o sistema de transmissão não conseguiu escoar toda a energia produzida. A compensação por curtailment é a tentativa de corrigir esse desequilíbrio financeiro.
Os Pontos Cegos da Lei e os Desafios para a Regulamentação
Apesar de prever a compensação, a Lei 15.269/2025 deixa diversas lacunas regulatórias que precisam ser preenchidas pela ANEEL e pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). O primeiro desafio para a regulamentação é definir o que exatamente constitui um evento compensável. Deve-se diferenciar o curtailment decorrente de falhas ou congestionamentos imprevistos daquele que foi considerado no planejamento inicial do projeto.
A lei, em sua sanção, manteve um dispositivo que exime de ressarcimento as restrições que já estavam previstas nos documentos de acesso à rede, como o Parecer de Acesso. Esse detalhe é um divisor de águas. Ele exige que a ANEEL defina o grau de detalhe e a clareza com que o ONS deve informar o risco de curtailment no momento da outorga, sob pena de gerar novos contenciosos.
Metodologia de Cálculo: O Novo Quebra-Cabeça da ANEEL
O maior desafio para a regulamentação é a metodologia de cálculo da compensação por curtailment. Como quantificar a energia que poderia ter sido gerada e qual o valor econômico dessa perda? O cálculo deve ser preciso para refletir o real prejuízo do gerador sem, contudo, onerar injustamente o consumidor ou o sistema.
A ANEEL terá que determinar se a compensação será baseada no Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) do momento, no Preço Médio da Contratação (PMC) ou em um valor de referência fixo. Além disso, a Agência precisa diferenciar a compensação integral (prevista para alguns casos do regime regressivo da Lei 15.269/2025) da compensação parcial para outras situações.
Uma das propostas em debate é a adoção de um “fator de eficiência” da rede, que penalizaria o operador em caso de desvios significativos. Isso criaria incentivos para o ONS e as transmissoras investirem na expansão e modernização da infraestrutura energética, mitigando a necessidade de curtailment em primeiro lugar, o que é o objetivo principal da transição energética.
Risco de Judicialização e a Segurança Jurídica
A indefinição dos critérios de compensação por curtailment cria um ambiente propício para a judicialização. Se a ANEEL falhar em estabelecer uma regulamentação robusta e aceita pelo mercado, os geradores de energia eólica e solar poderão buscar o Judiciário para pleitear o ressarcimento integral, alegando enriquecimento ilícito do sistema às suas custas.
A Fitch Ratings já alertou que, mesmo com as regras da Lei 15.269/2025, os impactos financeiros dos cortes não serão eliminados por completo, especialmente se a metodologia de cálculo da compensação for conservadora. Essa percepção de risco regulatório afeta diretamente o custo de capital para novos projetos, especialmente aqueles localizados em regiões com alta penetração de energia renovável e baixa capacidade de escoamento.
O dilema é equilibrar a proteção ao investimento privado em energia limpa com a necessidade de manter a estabilidade tarifária para o consumidor final. A regulamentação deve ser um ato de equilíbrio técnico e econômico que garanta a atratividade da energia eólica e solar sem desmantelar o modelo de custeio do sistema.
O Papel do ONS e a Gestão da Intermitência
Um ponto crucial na nova regulamentação será a gestão das restrições operativas impostas pelo ONS. A Agência e o Operador precisam trabalhar juntos para criar mecanismos de comunicação e reporting transparentes. O gerador precisa saber, em tempo real, quando, por que e por quanto tempo a sua produção de energia nova será cortada.
A transparência na comunicação é essencial para a segurança jurídica. A compensação por curtailment só pode ser bem-sucedida se houver dados confiáveis sobre a geração perdida e a causa da restrição. O setor elétrico clama por um sistema de medição e apuração de perdas robusto, que não deixe margem para dúvidas ou interpretações enviesadas na hora de calcular o ressarcimento.
A conclusão do processo de regulamentação pela ANEEL é o teste de fogo para a Lei 15.269/2025. O sucesso dessa regulamentação determinará se a nova lei será um verdadeiro catalisador da transição energética brasileira ou apenas mais uma fonte de judicialização e incerteza. O mercado espera que a Agência entregue, com urgência, regras justas que solidifiquem a compensação por curtailment como um pilar de previsibilidade para o futuro da energia renovável no Brasil.
Visão Geral
A Lei 15.269/2025 moderniza o setor elétrico, mas a compensação por curtailment representa seu principal ponto de tensão. A ausência de regras claras da ANEEL sobre a metodologia de cálculo e a definição de eventos compensáveis eleva o risco de judicialização. A efetivação da segurança jurídica para novos investimentos em energia limpa depende da urgência e da transparência com que a regulamentação abordar esses desafios para a regulamentação, especialmente no que tange à quantificação da perda de geração de energia eólica e solar.























