Revisão no Setor Elétrico Aponta Crescimento de 30% nas Emissões de CO2 em 2024 Devido à Dependência Térmica.
Conteúdo
- Visão Geral sobre o Desempenho da Matriz Elétrica
- O Custo da Seca: A Dominância do Despacho Térmico
- O Efeito Cascata no PLD e no Custo Sistêmico
- O Paradoxo da Energia Limpa Intermitente
- A Necessidade de Armazenamento de Energia (BESS)
- Os Riscos do Etiquetamento de Carbono
- O Futuro da Transição Energética
- Investimentos e o Foco no Longo Prazo
Visão Geral sobre o Desempenho da Matriz Elétrica
O setor elétrico brasileiro, frequentemente aclamado por ter uma das matrizes mais limpas do mundo, enfrenta um revés alarmante em 2024. Dados recentes indicam que a geração de energia no país resultou em emissões de CO2 aproximadamente 30% maiores em comparação com o mesmo período do ano anterior. Esse salto, digno de manchete e de preocupação profunda entre profissionais de energia limpa, escancara a vulnerabilidade do sistema e a dificuldade em conciliar a ambição de descarbonização com a imperiosa necessidade de segurança energética.
Para o engenheiro e o economista do setor, este número é um sinal claro de que a dependência hídrica ainda cobra seu preço. Quando a chuva falha, os reservatórios minguam e o sistema não tem alternativa senão acionar as usinas de Geração Térmica. O resultado é imediato: o carbono que esperávamos cortar volta a ser injetado na atmosfera em volumes significativos, colocando o Brasil na contramão da transição energética global neste momento.
O Custo da Seca: A Dominância do Despacho Térmico
O aumento de 30% nas emissões de CO2 é um reflexo direto da baixa afluência hídrica nas principais bacias do país, especialmente no Sudeste e Centro-Oeste. O Operador Nacional do Sistema (ONS) é obrigado, por protocolo de segurança energética, a despachar a Geração Térmica quando o fator de capacidade hidrelétrica (Geração Hidráulica) está baixo. Isso garante que as luzes não se apaguem, mas ao custo de usar combustíveis fósseis.
A maior parte dessa Geração Térmica vem de usinas movidas a Gás Natural, Carvão e Óleo Combustível. Embora o Gás Natural seja menos poluente que o Carvão, ele ainda é um grande emissor de carbono. O aumento súbito na queima desses insumos é o que justifica o percentual chocante de emissões de CO2 em 2024. A nossa matriz elétrica brasileira é limpa na teoria, mas suja na hora da crise.
O Efeito Cascata no PLD e no Custo Sistêmico
O impacto não é apenas ambiental; é financeiro. O acionamento da Geração Térmica é caro. As usinas termelétricas, especialmente as de óleo, possuem um Custo Variável Unitário (CVU) muito superior ao custo marginal da hidroeletricidade. Essa elevação de custo é repassada diretamente para o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD).
Quando o PLD sobe, todo o setor elétrico sente. Consumidores do Mercado Livre de Energia (MLE) enfrentam faturas mais altas, e os consumidores cativos arcam com encargos adicionais nas bandeiras tarifárias. O aumento de emissões de CO2 está intrinsecamente ligado a um sistema mais oneroso e menos eficiente. A transição energética não pode ser feita às custas da estabilidade econômica.
O Paradoxo da Energia Limpa Intermitente
O Brasil tem investido pesadamente em energia limpa, com recordes de instalação em eólica e solar. Contudo, essas fontes são intermitentes. Uma usina solar não gera à noite; um parque eólico não gera em momentos de calmaria. O crescimento da Energia Limpa intermitente, sem um *backup* firme e de baixo carbono, aumenta a pressão sobre a Geração Térmica fóssil nos momentos de pico ou baixa afluência hidrelétrica.
É um paradoxo: investimos em descarbonização na ponta da geração, mas negligenciamos a firmeza e o armazenamento de energia. O resultado em 2024 é a necessidade de acionar fontes sujas para compensar a intermitência. A lição é clara: a expansão da Energia Limpa deve ser acompanhada por soluções de flexibilidade e segurança energética.
A Necessidade de Armazenamento de Energia (BESS)
A chave para reverter o pico de emissões de CO2 reside na massificação do armazenamento de energia (BESS – *Battery Energy Storage Systems*). Baterias de grande porte podem absorver o excesso de geração eólica e solar nos momentos de baixa demanda e liberá-lo quando a Geração Térmica seria necessária. Isso reduz o custo e o carbono.
O setor elétrico precisa de sinais regulatórios mais robustos da ANEEL para incentivar o investimento em BESS. A contratação de capacidade firme proveniente de armazenamento de energia em leilões é o caminho mais rápido para estabilizar a rede e cortar o cordão umbilical com as usinas termelétricas mais poluentes. Este é um investimento em segurança energética e ambiental.
Os Riscos do Etiquetamento de Carbono
O aumento das emissões de CO2 em 2024 acende um alerta sobre a reputação internacional da matriz elétrica brasileira. Em um mundo onde o ESG (*Environmental, Social and Governance*) é crucial, a etiqueta de “país de energia limpa” pode ser questionada. A indústria brasileira, que depende dessa credencial para exportar alumínio verde e aço de baixo carbono, está atenta.
A maior pegada de carbono da eletricidade afeta as metas de descarbonização de grandes consumidores e a atratividade do Brasil para investimentos verdes. Se o problema se repetir anualmente, os *players* globais de Energia Limpa podem reconsiderar o risco de intermitência e a necessidade de Geração Térmica de *backup* sujo.
O Futuro da Transição Energética
O desafio de 2024 não é isolado; ele é sistêmico. O Brasil precisa de uma transição energética que não apenas adicione Energia Limpa, mas que a torne *firme* e *despachável*. Isso implica modernizar a Geração Térmica (favorecendo o gás natural moderno ou a biomassa firme), mas, sobretudo, investir em flexibilidade e armazenamento de energia.
O setor elétrico tem a tecnologia e o potencial natural para ser 90% renovável sem sustos. Mas, para isso, a infraestrutura e a regulamentação precisam evoluir. O pico de emissões de CO2 em 2024 serve como um doloroso, mas necessário, lembrete de que a sustentabilidade da matriz elétrica brasileira exige mais do que apenas vento e sol; exige inteligência e segurança energética a todo custo.
Investimentos e o Foco no Longo Prazo
Os investimentos em Energia Limpa no Brasil devem ser reorientados para a qualidade da geração, e não apenas para o volume. Projetos que incluem armazenamento de energia e que ofereçam serviços ancilares à rede devem ser priorizados pela ANEEL e pelo ONS. A mitigação do risco hídrico, que força a Geração Térmica, é o caminho mais eficaz para uma real descarbonização.
A lição é que o país não pode depender da chuva. O setor elétrico deve aprender com os 30% a mais de emissões de CO2 em 2024 e investir em resiliência. Somente uma matriz elétrica brasileira robusta, flexível e inteligente poderá garantir a segurança energética do país, sem sacrificar os objetivos climáticos e econômicos da transição energética.























