A Nova Encruzilhada da Competitividade Brasileira
O Brasil possui uma matriz elétrica majoritariamente renovável, o que o posiciona favoravelmente na economia global de baixo carbono. Contudo, a persistente dependência do petróleo e os desafios relacionados ao desmatamento ameaçam essa vantagem, colocando em xeque sua competitividade verde e a credibilidade para sediar a COP30.
A Dependência do Petróleo e o Risco da Transição Energética
Com uma matriz elétrica que é quase 90% renovável, o Brasil se destaca como um fornecedor de produtos de baixo carbono entre os países do G20. Setores como agricultura, metais e centros de dados já demonstram competitividade em termos de emissões, abrindo portas para mercados emergentes como alumínio verde e aço de baixo carbono. Entretanto, as exportações de petróleo, que somam cerca de R$ 230 bilhões (US$ 40 bilhões) e sustentam mais de 71 mil empregos, estão sob crescente risco. Cerca de 87% desse petróleo é vendido para países com metas rigorosas de emissões líquidas zero, os quais estão ativamente buscando eliminar os combustíveis fósseis de suas matrizes energéticas.
A China e a União Europeia continuam sendo parceiros comerciais cruciais, responsáveis por mais de 40% das exportações brasileiras e sustentando 2,3 milhões de empregos. À medida que esses mercados implementam políticas climáticas mais estritas, a demanda por cadeias de suprimento com menor intensidade de carbono se intensifica, beneficiando exportadores com menor pegada ambiental. Paralelamente, o novo Regulamento Europeu de Desmatamento (EUDR) representa uma ameaça significativa para exportações ligadas à perda florestal, podendo impactar cerca de R$ 86 bilhões (US$ 15 bilhões) anualmente e afetar mais de 200 mil empregos se as cadeias de produção não forem desassociadas do desmatamento.
Oportunidades nos Biocombustíveis e a Pressão dos Mecanismos de Carbono
Em contraste com os riscos enfrentados pelo petróleo, o setor de biocombustíveis, como etanol e biodiesel, está bem posicionado para expansão. Esses produtos já compõem 22% do combustível usado no transporte doméstico e estão em alta demanda em setores difíceis de eletrificar, como aviação, transporte marítimo e rodoviário pesado. Por outro lado, os riscos comerciais associados a produtos com emissões intensivas continuam a aumentar. Mais de 1 milhão de empregos brasileiros dependem de exportações para mercados onde Mecanismos de Ajuste de Carbono nas Fronteiras (CBAM) já estão em vigor, como a União Europeia e o Reino Unido.
Outros 478 mil empregos estão ligados a destinos que estão avaliando a implementação de medidas climáticas similares. Isso evidencia a crescente exposição da economia nacional à transição global em direção a padrões de baixo carbono. O relatório da Net Zero Tracker aponta que o Brasil tem uma oportunidade única de converter sua energia limpa em poder comercial, aproveitando seu vasto potencial renovável e influência internacional.
A Visão dos Especialistas sobre a Liderança Verde
Especialistas reforçam o potencial transformador da transição energética brasileira. John Lang, líder da Unidade de Inteligência Energética e Climática do Net Zero Tracker, afirma:
“O Brasil está numa posição única para transformar a sua energia limpa em poder comercial. Com um vasto potencial renovável, know-how industrial e influência internacional crescente, ele pode liderar a próxima onda de industrialização verde.”
No entanto, Lang alerta que a inação pode ser custosa:
“Mas a concorrência está aumentando rapidamente — e o Brasil não pode liderar a economia verde enquanto se agarra aos mercados fósseis. O país deve se concentrar na construção das novas indústrias de baixo carbono do futuro.”
Matt Elliott, coautor do relatório, descreve a situação como um ponto de inflexão:
“A análise mostra um país numa encruzilhada — com a sua vantagem em energia limpa a puxá-lo para mercados verdes em expansão, enquanto sua crescente dependência das exportações de petróleo o prende a indústrias que o mundo está rapidamente deixando para trás”.
O Custo da Inação e a Atração de Investimentos
A análise demonstra que 266 grandes empresas nos dez principais mercados de exportação do Brasil — com receitas anuais de R$ 53,58 bilhões (U$ 9,4 bilhões) — já possuem metas de emissões líquidas zero de Escopo 3. Isso implica que essas empresas priorizarão, cada vez mais, fornecedores com baixas emissões de carbono. Com a implementação de políticas coordenadas em áreas como indústria, energia e governança florestal, o Brasil tem potencial para atrair bilhões em novos investimentos de empresas globais focadas na descarbonização de suas cadeias de abastecimento. Um exemplo disso é a parceria da gigante chinesa Envision em maio de 2025 para desenvolver um Parque Industrial Net Zero, utilizando a abundante energia limpa do país para produzir Combustível de Aviação Sustentável (SAF).
O risco é que o progresso estagne sem ações decisivas para alinhar as políticas comerciais, energéticas e florestais. A aplicação inconsistente das leis anti-desmatamento, a exploração contínua de combustíveis fósseis e as ineficiências industriais podem erodir a “vantagem de carbono” do Brasil em um momento em que as normas comerciais de emissões líquidas zero se tornam mais rígidas. Thomas Hale, professor da Universidade de Oxford, conclui que a liderança correta pode alavancar as vantagens naturais do país para assegurar uma competitividade duradoura na manufatura verde e na agricultura sustentável.























