O setor elétrico brasileiro precisa priorizar a visão estratégica sobre o preço de curto prazo para assegurar o controle de seus recursos energéticos.
Conteúdo
- Visão Geral: O Desafio do Planejamento Energético
- O Significado Real da Soberania Energética
- O Risco da Ditadura do Curto Prazo no Planejamento Energético
- O Gás Natural Como Garantia de Estabilidade e Soberania Energética
- Pragmatismo Contra a Burocracia no Planejamento Energético
- Integrando a Transição Energética com a Segurança do Suprimento
- O Desafio da Autossuficiência e o Desenvolvimento Regional Impulsionado pelo Gás Natural
- A Lição Geopolítica da Vulnerabilidade e a Soberania
- Conclusão: A Necessidade de um Novo Contrato Social Energético
O setor elétrico brasileiro vive um momento de profunda transformação. Enquanto a transição energética impulsiona a expansão de fontes renováveis, um debate fundamental sobre a visão de longo prazo reacende: a importância da soberania energética. Luiz Felipe Coutinho, CEO da Origem, empresa de energia focada no desenvolvimento do gás natural onshore, lançou um desafio direto aos formuladores de políticas: o planejamento energético nacional não pode mais ser guiado apenas pelo preço de curto prazo, mas sim pela garantia de controle estratégico dos nossos recursos.
Para o executivo, contratar a energia mais barata hoje pode significar uma armadilha de dependência amanhã. Essa visão pragmática e estratégica toca em um ponto sensível: a segurança do suprimento e a capacidade do país de gerir seus ativos sem vulnerabilidade a choques externos. A discussão é particularmente relevante para o Brasil, que, apesar de sua matriz limpa, ainda sofre com a intermitência hídrica e a volatilidade do mercado global de gás natural liquefeito (GNL).
Visão Geral: O Desafio do Planejamento Energético
A soberania energética transcende a simples autossuficiência. Segundo Coutinho, trata-se de gerir os recursos de forma racional e equilibrada em prol do interesse nacional e das gerações futuras. Isso implica adotar uma perspectiva que englobe a capacidade do país de tomar decisões estratégicas, sem ser refém de commodities ou geopolíticas de terceiros.
Em outras palavras, o planejamento energético deve avaliar o custo-benefício de cada fonte, incorporando métricas de segurança, estabilidade e desenvolvimento de cadeias produtivas internas. Priorizar o preço mais baixo em leilões, sem considerar a resiliência do sistema, é um erro que custa caro em momentos de crise hídrica ou conflito internacional. A Origem defende que a segurança precisa ser precificada.
O Risco da Ditadura do Curto Prazo no Planejamento Energético
O principal alvo da crítica do CEO da Origem é a obsessão regulatória e política pelo custo marginal de curto prazo. Quando o planejamento energético foca apenas em contratar a próxima megawatt-hora (MWh) pelo menor valor, ignora-se o custo de investimento em infraestrutura robusta e confiável, que demora anos para ser construída.
Coutinho argumenta que a energia mais barata contratada hoje, se for intermitente e sem back-up nacional, exige investimentos adicionais e emergenciais quando o vento não sopra ou a água seca. Esse custo oculto, que recai sobre o consumidor e a economia, desfaz a ilusão do preço baixo inicial. É um cálculo incompleto que penaliza a soberania energética do país.
O Gás Natural Como Garantia de Estabilidade e Soberania Energética
Neste contexto, o gás natural (GN) assume um papel de protagonista na manutenção da soberania energética. Para o CEO da Origem, o GN doméstico não é um concorrente das energias renováveis, mas sim seu parceiro indispensável. Ele funciona como o motor de base para a transição energética, garantindo a firmeza do sistema quando a geração eólica e solar oscilam.
A Origem, com seus investimentos na exploração e produção de gás natural em bacias terrestres e rasas, exemplifica a busca por um suprimento confiável e nacional. Utilizar o GN brasileiro reduz a dependência de GNL importado, cuja cotação está sujeita a variáveis geopolíticas fora do controle do Brasil.
Pragmatismo Contra a Burocracia no Planejamento Energético
A visão da Origem clama por mais pragmatismo no desenho do planejamento energético. Coutinho frequentemente compara a abordagem brasileira, marcada por longos processos legais e regulatórios, com a de países que priorizam a engenharia e metas estratégicas claras. Essa crítica sugere que o excesso de burocracia e a falta de uma visão unificada atrasam investimentos cruciais.
Um planejamento energético soberano exige menos hesitação e mais ação determinada. Significa definir quais recursos e quais tecnologias são essenciais para o futuro do Brasil, mesmo que não apresentem o menor custo imediato. A segurança e a resiliência, neste cenário, são ativos estratégicos, não apenas despesas.
Integrando a Transição Energética com a Segurança do Suprimento
A urgência climática exige uma rápida transição energética para fontes limpas. No entanto, o CEO da Origem alerta que essa transição deve ser inteligente e segura. A soberania não se resume a ter sol e vento em abundância; ela se constrói na capacidade de armazenar ou complementar essa energia de forma confiável.
Se o Brasil apostar apenas em renováveis intermitentes sem desenvolver a infraestrutura de flexibilidade (como termoelétricas a gás natural e armazenamento em baterias em larga escala), a dependência se transferirá para a importação de tecnologia estrangeira (baterias, por exemplo). O país estaria trocando uma dependência de commodities fósseis por uma dependência tecnológica.
O Desafio da Autossuficiência e o Desenvolvimento Regional Impulsionado pelo Gás Natural
O investimento no gás natural nacional, segundo a tese da Origem, tem um efeito multiplicador que vai além da geração de eletricidade. Ele impulsiona o desenvolvimento regional, gera empregos de alta qualificação e fortalece a indústria petroquímica e de fertilizantes. Esse é o verdadeiro cerne da soberania energética para a indústria.
O planejamento energético deve, portanto, ser uma ferramenta de política industrial. Ao invés de apenas buscar o supply mais barato, deve-se buscar o supply que mais contribui para o Produto Interno Bruto (PIB) e para a segurança nacional. Essa abordagem exige coragem para traçar metas de longo prazo que resistam a mudanças políticas e econômicas de ciclos curtos.
A Lição Geopolítica da Vulnerabilidade e a Soberania
As crises globais recentes, da Guerra na Ucrânia à instabilidade no Oriente Médio, demonstraram como a dependência de energia externa pode desestabilizar economias. Países europeus, por exemplo, pagaram um preço altíssimo pela dependência do gás natural russo. O Brasil, embora mais isolado geograficamente, não está imune.
O planejamento energético soberano significa ter fontes diversificadas e, idealmente, domésticas, que possam ser acionadas em qualquer cenário. A expansão da produção de gás natural da Origem e de outros players é, neste sentido, um investimento direto na imunidade econômica do país contra choques de preço internacionais. O preço da soberania é, na verdade, o preço da estabilidade.
Conclusão: A Necessidade de um Novo Contrato Social Energético
A mensagem do CEO da Origem é um convite à maturidade para o setor. O planejamento energético do Brasil precisa de um novo contrato social, onde o conceito de soberania se torne um imperativo estratégico, e não uma opção. Para a Origem, o futuro passa por reconhecer que o gás natural doméstico é a peça-chave para equilibrar a transição energética com a segurança do suprimento.
O desafio é alinhar os interesses de custo do mercado com os imperativos de segurança do Estado. Somente com um planejamento energético que enxergue a soberania como valor, o Brasil garantirá não só luz barata, mas, sobretudo, luz constante e controle sobre o próprio destino econômico. Isso exige uma revolução na forma como o Brasil pensa e executa sua política de energia.























