Avanço da PEC das Agências no Congresso suscita preocupações sobre a autonomia regulatória da ANEEL e o risco para investimentos no setor elétrico.
Conteúdo
- Visão Geral da PEC 4/2024 e o Alarme no Setor Elétrico
- O “Power Grab” Institucional e a Revisão de Atos Regulatórios
- Impacto Direto na ANEEL e nas Energias Renováveis
- Insegurança Jurídica: O Terror do Capital Estrangeiro
- O Argumento da Accountability Democrática
- A Batalha na Câmara e a Pressão do Setor
- Conclusão: A Opção Pela Estabilidade e o Futuro do Setor Elétrico
Visão Geral da PEC das Agências e o Alarme no Setor Elétrico
Uma verdadeira bomba de efeito político-institucional acaba de ser acionada no setor elétrico brasileiro. A Câmara avança com PEC das Agências, uma Proposta de Emenda à Constituição que visa conceder ao Congresso Nacional o poder de revisar atos de reguladoras, como a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica). A tramitação da chamada PEC das Agências ou PEC 4/2024 é o tema mais quente em Brasília, gerando um alarme generalizado entre os profissionais de energia limpa, investidores e qualquer um que dependa da segurança jurídica para tocar projetos de longo prazo no país.
Se aprovada, a PEC das Agências pode desmantelar a autonomia técnica conquistada pelas agências ao longo de décadas. O setor elétrico, que depende de regras estáveis para investimentos bilionários em infraestrutura de Geração Distribuída (GD), eólica e solar, vê a proposta como uma ameaça direta à previsibilidade. O medo é claro: transformar decisões técnicas em moeda de troca política, expondo tarifas e projetos de energia renovável à influência de lobbies.
O “Power Grab” Institucional e a Revisão de Atos
O cerne da PEC das Agências é simples, mas devastador para a segurança jurídica. Ela estabelece que o Congresso poderá sustar, por decreto legislativo, atos normativos das agências reguladoras (como resoluções e regulamentos da ANEEL) que exorbitem o poder regulamentar. O problema reside na definição de “exorbitar”. Na prática, o Congresso se tornaria uma espécie de instância revisora superior, com poder para anular decisões técnicas que desagradem a maioria política ou grupos de interesse.
Historicamente, as agências reguladoras foram criadas para blindar os setores de infraestrutura da política de curto prazo. A ANEEL, por exemplo, utiliza modelos matemáticos complexos para definir tarifas (Revisão Tarifária Periódica – RTP) e estabelecer as regras dos leilões de energia. Se o Congresso puder revisar atos de reguladoras a qualquer momento, o cálculo de risco para o investimento em energia limpa dispara, e o capital pode simplesmente migrar para mercados mais estáveis.
O processo de revisão de atos regulatórios é rápido e perigoso. Diferentemente do trâmite de leis que exigem sanção presidencial, um decreto legislativo passa apenas pelo Congresso. A rapidez com que uma decisão técnica da ANEEL poderia ser derrubada inviabiliza o planejamento de infraestrutura que leva anos para ser executado, especialmente nos segmentos de Transmissão e Geração.
Impacto Direto na ANEEL e nas Energias Renováveis
A ANEEL está na linha de frente dessa batalha. Em um setor elétrico onde a energia solar e eólica dominam a expansão da geração, as decisões da Agência são vitais. Pense, por exemplo, na controversa regulamentação da Geração Distribuída (GD) (Lei 14.300) ou nas regras de Cortes na Geração por sobrecarga de rede.
A PEC das Agências daria ao Congresso o poder de revisar atos de reguladoras em questões cruciais como a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e a definição dos subsídios custeados pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Se houver uma decisão técnica da ANEEL para reduzir um subsídio ou aumentar uma tarifa específica, um grupo de pressão pode acionar o Congresso, pedindo a anulação do ato.
Isso cria um cenário de insegurança jurídica sem precedentes para as energias renováveis. Investidores em projetos de hidrogênio verde e eólica offshore, que dependem da ANEEL para definir as regras de conexão à rede e as Garantias Físicas, não terão mais a garantia de que as regras vigentes na data do investimento serão mantidas. O risco político se sobrepõe ao risco de mercado.
Insegurança Jurídica: O Terror do Capital Estrangeiro
A insegurança jurídica é o maior inimigo do investimento em infraestrutura. Projetos de energia limpa são ativos de vida longa, exigindo capital paciente com retorno garantido por contratos e regras estáveis. A PEC das Agências introduz a incerteza no nível constitucional.
Empresas estrangeiras, que hoje veem o Brasil como um mercado atraente devido ao seu potencial em energia renovável, podem recuar. Para elas, a autonomia das reguladoras é um indicador de governança e qualidade institucional. Se o Congresso puder revisar atos de reguladoras como a ANEEL, o Brasil passa a ser visto como um mercado de alto risco político, elevando o custo de capital e inviabilizando projetos de Transição Energética.
A crítica do mercado é unânime: a PEC das Agências é um tiro no pé do desenvolvimento. A ANEEL já sofre pressões para revisar atos de reguladoras, mas o canal institucional atual exige judicialização e debates técnicos. A PEC transforma essa pressão em um botão de acionamento imediato no plenário.
O Argumento da Accountability Democrática
Os defensores da PEC das Agências, geralmente parlamentares, argumentam que a proposta visa corrigir uma distorção democrática. O argumento central é que as agências reguladoras se tornaram “Quartos Poderes”, compostos por tecnocratas não eleitos que tomam decisões que afetam diretamente a vida de milhões de brasileiros, como o aumento da tarifa de energia.
Segundo essa visão, o Congresso, como legítimo representante da vontade popular, deve ter a palavra final. A revisão de atos de reguladoras seria, portanto, um instrumento de accountability, garantindo que os regulamentos não se desviem dos objetivos das leis criadas pelos legisladores.
Embora o princípio da responsabilidade democrática seja válido, o setor elétrico teme que ele seja usado como pretexto para a interferência política na gestão diária e técnica da ANEEL. A regulamentação de energia exige expertise e imparcialidade; se cada reajuste tarifário se tornar uma disputa política no Congresso, o sistema se torna ingovernável e ineficiente.
A Batalha na Câmara e a Pressão do Setor
O setor elétrico está mobilizado contra a PEC das Agências. Associações de geradores, distribuidores, transmissores e comercializadoras alertam que a medida pode paralisar a agenda de investimento. O lobby nos gabinetes é intenso, visando convencer os deputados de que, embora a intenção possa ser boa, o efeito prático será catastrófico para a segurança jurídica do país.
A urgência é real: a Câmara avança com PEC das Agências em ritmo acelerado. O Congresso precisa ser convencido de que o remédio proposto — a revisão de atos de reguladoras — é mais perigoso do que a doença. Alternativas, como fortalecer os mecanismos de diálogo institucional entre o Legislativo e a ANEEL, seriam mais saudáveis para a governança do setor elétrico.
O setor de energia limpa clama por estabilidade. Para construir os projetos necessários para atingir as metas de descarbonização, o Brasil precisa de uma ANEEL forte e autônoma. A PEC das Agências, ao minar essa autonomia, coloca em xeque o futuro da Transição Energética brasileira. O risco de que decisões sobre energia solar ou eólica sejam revertidas por conveniência política é o grande fantasma que paira sobre o mercado.
Conclusão: A Opção Pela Estabilidade e o Futuro do Setor Elétrico
A Câmara avança com PEC das Agências em um momento em que o Brasil mais precisa de confiança institucional para atrair o investimento em infraestrutura verde. A proposta, que permite ao Congresso revisar atos de reguladoras como a ANEEL, é um convite à insegurança jurídica e à politização de decisões eminentemente técnicas.
Se a PEC das Agências for aprovada, a ANEEL perderá sua capacidade de arbitrar conflitos e de impor regras impopulares, mas tecnicamente necessárias. O setor elétrico, especialmente as energias renováveis, será o principal prejudicado. O Congresso tem nas mãos a decisão de fortalecer a governança do país ou de introduzir o risco político na Constituição, inviabilizando o capital de longo prazo essencial para o futuro limpo e seguro do Brasil.